Utilização da genética
Base de dados de ADN está pronta a arrancar e promete diminuir crimes por resolver
05.12.2008 - 08h41 Natália Faria
Base de dados de ADN está pronta a arrancar e promete diminuir crimes por resolver
05.12.2008 - 08h41 Natália Faria
Foi dado o passo que faltava para a criação da base de dados portuguesa de perfis de ADN para identificação civil e criminal. O regulamento e as regras de funcionamento que faltavam para pôr em prática aquele instrumento foram publicados, anteontem, em Diário da República, pelo que o Instituto Nacional de Medicina Legal (INML) está agora apto a recolher a informação genética de todos os condenados por crimes dolosos com penas de prisão concreta igual ou superior a três anos de prisão.A expectativa do secretário de Estado adjunto e da Justiça, Conde Rodrigues, é que este instrumento (recentemente criado também pela Espanha e pela Grécia) reduza substancialmente a taxa de crimes que ficam por resolver, bem como o número de cadáveres que chegam ao INML e que acabam por ser inumados sem chegarem a ser identificados. "Estávamos atrás dos outros países nesta matéria e agora temos todas as condições técnicas e humanas para que, no respeito pelos direitos fundamentais, combater o crime e identificar pessoas desaparecidas de forma muito mais eficaz", declarou ao PÚBLICO. O presidente do INML, Duarte Nuno Vieira, também aplaude de pé a criação desta base genética. "É um instrumento essencial à investigação criminal, pelo qual nos vínhamos batendo há vários anos." A informação da primeira base de dados genética portuguesa ficará instalada na sede do INML em Coimbra e ficará sob a direcção de Francisco Corte-Real, especialista em genética forense e director da Delegação do Centro do INML.Autor do regulamento desta lei, Corte-Real garante que a confidencialidade dos dados está assegurada e que "em caso algum os marcadores de ADN poderão revelar qualquer informação sobre as características patológicas ou hereditárias dos indivíduos". Cortando de raiz qualquer risco de utilização abusiva dos dados que vierem a ser recolhidos, Conde Rodrigues lembra que a lei portuguesa (5/2008, de 12 de Fevereiro) é muito mais cautelosa do que a da Grã-Bretanha (ver texto nesta página). "Na investigação criminal, vai ser sempre precisa autorização judicial quer na inclusão dos perfis genéticos na base, quer no cruzamento posterior desses perfis", explicou. "Há países em que isso não acontece, mas nós quisemos ser mais eficazes no combate ao crime, sempre no respeito pelos direitos fundamentais", frisou. Corte-Real concorda e garante também que "não será possível, como na Grã-Bretanha, incluir suspeitos de crimes na base de dados e muito menos mantê-los lá depois de terem sido absolvidos". Pensada para identificar criminosos, bem como para reconhecer desaparecidos, a base de dados de ADN portuguesa terá vários ficheiros diferentes, para separar as águas entre os perfis recolhidos para investigação criminal e aqueles que visam a identificação civil. Por outro lado, "os perfis de ADN e os dados pessoais ficarão separados fisicamente", segundo Francisco Corte-Real. No tocante à identificação civil, a base será constituída a partir da recolha de amostras em voluntários que queiram o seu perfil referenciado. "Há dois anos, no incêndio da serra da Estrela, morreram cinco pilotos chilenos e o INML conseguiu identificar os cadáveres que tinham registos do seu ADN na base de dados do respectivo país", ilustrou Conde Rodrigues. Do mesmo modo, será possível fazer identificações de pessoas desaparecidas (com autorização da família) e recolher amostras em cadáveres. "Nos gabinetes do Porto, Coimbra e Lisboa do INML aparecem todas as semanas cadáveres que muitas vezes são enterrados ou inumados sem chegarem a ser identificados. Sendo possível cruzar esses perfis genéticos com os pedidos sobre desaparecidos que nos chegam de famílias e da polícia, haverá menos corpos por identificar", aponta Corte-Real. No âmbito do combate ao crime, é o director nacional adjunto da Polícia Judiciária, Pedro Carmo, a elencar as vantagens. "Ao permitir a comparação de amostras de ADN recolhidas nos locais dos crimes ou nas próprias vítimas, as vantagens são imensas. Será muito mais fácil identificar vítimas de crimes violentos, bem como os seus autores, nomeadamente nos casos de crimes que tenham deixado vestígios biológicos", como sangue ou esperma. Seis mil "perfis" por anoNo tocante aos criminosos, a lei já permite a recolha de amostras de ADN para a resolução de um crime específico. Só que a partir de agora, esses perfis genéticos poderão ser integrados numa base de dados. Isto só se aplica, porém, aos casos dos condenados por crimes dolosos com pena concreta de prisão igual ou superior a três anos. E sempre por despacho do juiz do julgamento. E será necessário mandado judicial para fazer comparação de amostras. Prevê-se que à volta de seis mil presos possam, em cada ano, em Portugal, ser sujeitos à recolha de amostras de ADN. "O instrumento será particularmente útil nos casos de criminosos reincidentes, permitindo, além disso, afastar desde logo, as suspeitas sobre algumas pessoas", acrescentou Pedro Carmo. A recolha será feita nos laboratórios do INML, da polícia científica da PJ ou nos laboratórios autorizados. Nestes casos, o perfil genético manter-se-á na base de dados até ao fim do prazo de prescrição do procedimento criminal. "Quando o indivíduo ficar com registo criminal limpo, deixa de fazer sentido mantê-lo na base de dados", esclareceu Corte Real.
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